Folha tenta enganar e/leitor

Os textos abaixo foram retirados do site da folha. A manipulação corre solta, fica claro que a folha tem candidato. As criticas que Mercadante e Russomano fazem a segurança publica deveriam ser apoiadas pelos jornalistas, pois eles mesmos vivem atrás de grades e tem seus carros no seguro contra roubo. Notem quantas vezes é repetido que Alckmin lidera a pesquisa, como se a pesquisa fosse infalivel e incorruptivel. Alem disso essa pesquisa foi feita antes do debate em que Alckmin foi desastroso, dizendo que São Paulo não tem problemas, que os professores ganham muito bem e que os policiais não precisam fazer bicos. Ele deve viver no mundo da lua, tal qual o padrinho dele o neo-maluco FHC, aquele que queria liberar a maconha.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po1308201016.htm

Alckmin vira alvo de todos no debate da Band em SP
Mercadante e Russomanno fazem dobradinha para criticar segurança

Acuado pelos ataques de adversários, tucano investe contra governo de Lula, em tom mais incisivo que o de Serra

DE SÃO PAULO

Líder com folga nas pesquisas de intenção de voto, o candidato Geraldo Alckmin (PSDB) foi o único alvo de seus cinco adversários pelo governo de São Paulo em debate da Band, ontem à noite.
Diante da limitação, pelas regras do programa, ao número de perguntas a cada candidato, os principais adversários do tucano -Aloizio Mercadante (PT), Celso Russomanno (PP) e Paulo Skaf (PSB)- acabaram protagonizando quatro tabelinhas com críticas ao PSDB e a Alckmin.
No momento em que os jornalistas da Band formulavam perguntas, no quarto bloco, a polarização PSDB-PT também acabou prevalecendo, com perguntas para Alckmin com comentários de Mercadante, e vice-versa.
Os temas preferenciais de ataque ao tucano, que, segundo o último Datafolha, seria eleito ainda no primeiro turno, foram a segurança pública, a disseminação do consumo de crack, o preço dos pedágios, educação e saúde.
Acuado por ser foco das críticas, Alckmin contrariou a ideia de que líderes em pesquisas (tem 49% no último Datafolha) não devem bater boca e partiu para o ataque contra o governo Lula, em tom mais incisivo que o que vem sendo usado pelo presidenciável José Serra.
“[Há aqui uma] aliança entre o PT e o malufismo, uma aliança estranha. Até as gravatas dos candidatos são iguais”, disse o tucano, em referência à dobradinha entre o petista e Russomanno.
No segundo bloco, questionado por Mercadante sobre a qualidade da educação e após ouvir o petista ler o trecho de um relatório encaminhado por Serra ao TCE (Tribunal de Contas do Estado) com uma série de críticas à qualidade das escolas e do ensino, Alckmin adotou o seu tom mais agressivo.
“O senador [Mercadante] é ótimo para criticar, mas não conheço nada de positivo que tenha feito para São Paulo, absolutamente nada, a não ser criticar”, afirmou o tucano, que ainda acusou o PT de ter diminuído o orçamento para a educação quando comandou a Prefeitura de São Paulo.
Ao citar o fato de o tratamento de dependentes químicos não ser coberto pelo SUS (Sistema Único de Saúde), afirmou que isso ocorre por “preconceito”.
Ao longo do debate, o tucano colou-se à imagem do ex-governador Mario Covas (PSDB), morto em 2001, mas só mencionou Serra em suas considerações finais.
Chegou até a citar um tema delicado para o presidenciável -a relação com os professores estaduais- como um ponto positivo de sua gestão: “No meu governo os professores não fizeram greve.”
Já o petista Mercadante se escorou na popularidade do presidente Lula, ao dizer que tem “honra de ser líder do governo do presidente Lula, [com quem] andei mais de 30 anos pelo país”. O petista ainda citou a candidata à Presidência, Dilma Rousseff.
Apesar do clima mais tenso que o do debate presidencial, o programa teve baixa audiência na contabilização parcial -2,5 pontos na Grande São Paulo. Isso equivale a 150 mil domicílios. No horário, a Band só esteve à frente da Rede TV e da TV Gazeta.

BASTIDORES
Serra resolveu ir ao estúdio ver o debate, mas saiu antes do término, junto com o prefeito Gilberto Kassab.
Questionado pela Folha sobre onde se sentia melhor- debatendo ou assistindo-, Serra respondeu: “Gosto daqui [plateia] e de lá. Na verdade, sou um louco por debates”, afirmou.
Com tantos políticos de peso, faltaram lugares para convidados do tucano Alckmin. Pouquíssimos vereadores aliados conseguiram entrar no estúdio para acompanhar o debate. Até o coordenador da campanha do tucano, deputado estadual Sidney Beraldo , ficou de fora.
(BRENO COSTA, DANIELA LIMA E EVANDRO SPINELLI)

Publicado em Uncategorized | Marcado com | Deixe um comentário

A dura luta em São Paulo

DOMINGO, 18 DE JULHO DE 2010
Esfinge ou Medusa da política brasileira

http://pedroayres.blogspot.com/2010/07/esfinge-ou-medusa-da-politica.html

Eleições e mitos políticos em São Paulo
Por Pedro Ayres
Jornalista
A campanha política brasileira entrou em sua reta final. Todos os partidos e candidatos se apresentam com propostas e projetos. Estado por Estado, região por região, o quadro político parece estar em processo de definição. Embora a grande mídia tudo faça para favorecer o candidato do PSDB, as mais sérias indicações precisam a provável vitória de Dilma Rousseff, da aliança popular progressista -PT, PDT, PSB, PCdoB. É um cenário completamente em desacordo com os desejos da elite empresarial e oligárquica brasileira, como se pode ver pela simples leitura dos grandes jornais e revistas, que, seguindo o roteiro traçado desde Washington, porfiam por outro resultado.
Para esses grupos, nacionais e estrangeiros, pouco importa se os seus planos redundarem na ruptura democrática do país. O que importa, a exemplo de Honduras e de todos os golpes de Estado propiciados pelo establishment estadunidense, é que haja a preservação e até o aumento de seus interesses na região ou no país.
Dentre os Estados brasileiros mais importantes, há um cujas características o colocam como fundamental, não para decidir o processo eleitoral, mas, para garantir o equilíbrio político-econômico federativo sem os óbices que existem até hoje. É o Estado de São Paulo. Um Estado rico, populoso, com a maior capacidade industrial instalada do país, mas, que, hoje em dia, por força de sua própria ação e dos efeitos da crise no seio dos países capitalistas mais desenvolvidos, está a sofrer os primeiros sinais de decadência.
Para o Brasil, como um conjunto federativo, São Paulo precisa ser rápido e celeremente integrado. O país precisa de suas estruturas universitárias e tecnológicas, de sua experiência produtiva e até mesmo do aprendizado com seus erros, para formar um Banco de Idéias, de Experiências e de Futuro, como base para um novo modelo desenvolvimentista. Um modelo em que as ilusões liberais ou neoliberais sejam abandonadas em prol de uma visão integrada de crescimento de país e latino americana.
O presente post é uma modesta contribuição para um debate. Um debate que poderá produzir um novo pensar e uma nova visão sobre São Paulo e sua relação com o Brasil. Não podemos nos permitir ver São Paulo, ora como uma cruel e enigmática Esfinge, ora como a predadora Górgona.
*********************
No início do século XIX, com a independência do Brasil, São Paulo firmou-se como província e centro econômico-financeiro muito importante, convertendo-se em núcleo de atividades intelectuais e políticas. Algo que serviria como fortalecimento para a estrutura econômica oligárquica dominante em toda a província. Uma estrutura que, em um sistema de alianças locais e externas, irá conformar um forte setor terciário e base para o financiamento de setor secundário que estava embrionário. Concorreram também para isso, a criação da Escola Normal, a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, a impressão de jornais e livros e o incremento das atividades culturais. No final do século, a cidade e a província passaram por profundas transformações econômicas e sociais decorrentes da expansão cafeeira em várias regiões paulistas, da construção da estrada de ferro Santos-Jundiaí (1867) e do afluxo de imigrantes europeus. Nesse período, a área urbana cresceu e surgiram as primeiras linhas de bondes, os reservatórios de água e a iluminação a gás.
O século XX, com suas manifestações econômicas, culturais e artísticas, passa a ser sinônimo de progresso. A riqueza proporcionada pelo café espalha-se na São Paulo “moderna”. Trens, bondes, eletricidade, telefone, automóvel, velocidade, a cidade cresce, agiganta-se e recebe muitos equipamentos urbanos como calçamento, praças, viadutos, parques e os primeiros arranha-céus. Eram os sinais do capitalismo que a iria dominar e determinar o pensar paulistano, ora pelo apelo a uma estética urbana européia, ora pela adoção da desordem vertical estadunidense. Enfim, havia a fantasia de que naquele cadinho de gente estava se construindo um país, não um simples Estado da federação. O centro comercial com escritórios e lojas sofisticadas, expõe em suas vitrinas a moda recém lançada na Europa. Enquanto o café excitava os sentidos no estrangeiro, as novidades importadas chegavam a Santos e subiam a serra em demanda à civilizada cidade Planaltina. Sinais telegráficos traziam notícias do mundo e repercutiam na imprensa local. Navios com produtos finos para a alta classe e repletos de imigrantes italianos e espanhóis rumo às fazendas ou às recém instaladas indústrias, eram sintomas de um mesmo processo, a expansão capitalista desenfreada e ambiciosa de tudo, principalmente de fortuna e poder.
Na década de 20, a industrialização ganha impulso, a cidade cresce e o café sofre uma grande crise, o Crack de 29, que não só iria depreciar essa riqueza paulista, como provocaria a quebra de alguns grupos financeiros. Um quadro negativo para àquelas famílias que quebraram, porém uma oportunidade para o enriquecimento de outras famílias e grupos econômico-financeiros externos. No entanto, a elite paulistana, freqüenta os salões de dança, assiste às corridas de automóvel, às partidas de futebol, às demonstrações de aeroplanos, vai aos bailes de máscaras e participa de alegres corsos nas avenidas da cidade. Nesse ambiente, surge o irrequieto movimento modernista. Um movimento em que um tipo de nacionalismo primitivista dá o ponta-pé no que chamavam de démodé, embora fosse quase que um eco da inquietação vivida em Paris e Nova York, que viviam os últimos resquícios das influências da Belle Époque, com a Art Nouveau e a Art Deco em processos de mudança. Era um nacionalismo mais ao estilo de um Marinetti futurista, mas preso aos grilhões da ascensão burguesa e com as ilusões de grandeza de sua atitude de classe.
No entanto, para comprovar que sempre há o novo em qualquer tipo de processo, é no bojo da oligarquia paulista vai surgir o político que, representando a transição entre o getulismo e o antigetulismo, terá grande força e liderança no Estado de São Paulo: Ademar de Barros. Com ele a política da elite paulista ganha um temporário aliado, pois, em termos de classe, seus interesses estavam entre os anseios de uma frágil burguesia nacionalista que ousava ser poder no seio do capital industrial e financeiro oligopolista internacional e entre os acenos de prosperidade material para a baixa pequena-burguesia e segmentos do proletariado. O interessante é que Ademar fazia parte de uma das mais antigas famílias da oligarquia cafeeira paulista, entretanto, talvez por ter sido um excelente médico e alguém muito preocupado com os problemas sanitários de sua região e país, tornou-se sensível ao que se poderia intitular compaixão para com os mais humildes e mais pobres. Assim, desde 1934 até a sua morte em 1969, Ademar de Barros foi um claro exemplo do comportamento vacilante da burguesia brasileira, às vezes ciosa de crescimento, às vezes mais servil que o próprio servo.
Entretanto, como a sua força crescia e parecia ultrapassar os limites do Vale do Anhangabaú, logo passou a ser hostilizado, dentro e fora do sistema oficial de poder. Um quadro que teria o interregno de 1945/64. De fato, durante todo o período de 1945 a 1964, o sistema político brasileiro foi dominado por um conjunto de partidos de expressão nacional que não tinham maiores raízes em São Paulo – o PSD, o PTB e a UDN. Assim quando Jânio Quadros encabeça uma eleição vitoriosa, ao marcar o inicio do fim do pluripartidarismo estabelecido em 1945, surge o sonho de uma liderança de massas, juntamente com uma concepção de poder centralizado no crescimento econômico do Estado e em certa visão modernizadora do Estado brasileiro, ainda que alegremente atrelado aos objetivos do capital internacional como iria defender FHC tempos depois. É nessa fase que surge Jânio Quadros, um pequeno-burguês que irá ser o paladino da burguesia no combate ao “populismo” neogetulista de Adhemar de Barros.
É com Jânio Quadros que emerge a maior liderança política de São Paulo – embora ele fosse natural de Mato Grosso – e que irá dar origem a um dos maiores fenômenos políticos do país – vereador, deputado estadual, Prefeito de São Paulo, Governador e Presidente da República – uma seqüência vitoriosa ininterrupta e marcada por um discurso moralista e de grande efeito retórico. Para a elite paulista e paulistana, o mato-grossense era um enigma, pois, embora significasse a destruição daquilo que eles consideravam nocivo, que era a ascensão política das massas, de certa maneira, mesmo em sua forma hiperbólica e gongórica de se expressar, em Jânio havia a raiz de um novo processo. Um processo em que se mesclavam pedaços de nacionalismo e de aumento da soberania nacional, a necessidade de uma nova “abertura dos portos” e de um novo tipo de alinhamento político internacional, com pitadas do mais puro reacionarismo e preconceitos pequeno-burgueses.
Tudo indica que Jânio, um típico produto do capitalismo transitivo entre a Europa e os Estados Unidos, por força das grandes guerras que alteraram o eixo do sistema, sentiu a força dos ventos descolonizantes antiimperialistas que assolavam o mundo naquela época. Na Europa, os Estados, pressionados por uma força operária cada vez mais numerosa, atuante e revolucionária como provou com a Revolução Russa, são obrigados a abandonar o liberalismo clássico e a adotar o que seria chamado de Estado Capitalista de Bem-Estar Social. Assim, embora para muitos seja visto como um conservador, Jânio representou um determinado instante histórico e político da pequena-burguesia, que ansiava por grandes feitos e o reconhecimento da humanidade.
Nos Estados Unidos, já recuperados da grande crise dos anos 30 e com o esmagamento das visões políticas de esquerda, por força de um Ascenso exacerbado do nacionalismo capitalista, as conquistas sociais coletivas são gradual e seguramente eliminadas da vida pública, que foram as marcas políticas de gente como Huey Long e Franklin Delano Roosevelt, tal foi à força catalisadora da Segunda Grande Guerra, dos seus efeitos propagandísticos, da rude dominação imperialista pela forte e desmedida ambição acumuladora. Era o tempo dos heróis e dos poderosos selves-made-men e raivosos tycoons industriais e financeiros. Um modelo que vai servir para definir o sonho paulista.
É importante notar que São Paulo viverá grande parte de sua história sob o sedutor acalanto do poderio econômico e de um especialíssimo destino nacional, em que, como uma vez disse André Gunder-Frank, São Paulo acredita que ele determina os rumos do país, apenas porque reproduz com as demais regiões brasileiras o mesmo relacionamento econômico que o imperialismo tem para com o Brasil. E é, pois, dessa matriz ideológica que a política paulista vai se nutrir e ficar quase que marginalizada dos processos políticos decisórios.
Esta “relativa marginalidade” de São Paulo não significava, evidentemente, que não existissem interesses paulistas representados no governo e que as demandas oriundas desses interesses não se fizessem presentes e não fossem atendidas. Mas, se São Paulo era e é realmente o centro de gravidade econômica e social do país, seria natural esperar que os interesses do Estado não se fizessem, simplesmente, presentes em termos nacionais, mas que dessem a própria orientação e comando ao sistema. Esse fato inegável, contraria todas as simplificações teóricas que traduzem a política em termos mecanicistas, o que faria dos governos brasileiros, por definição, simples representantes dos interesses paulistas.
Em política, graças aos boatos, às mentiras e as meias-verdades que vão sendo criadas ao longo do tempo, há figuras e fatos que têm suas dimensões superestimadas. Como nos processos de fabulação ou míticos, nos quais o objetivo é reforçar uma determinada característica moral ou prática social, geram-se heróis e situações tão críticas que só a providência de um herói ou a ação divina poderia resolver, pode-se dizer que são práticas ideológicas mantenedoras do status ou às vezes, segundo a imagística popular, expressões dos novos tempos. No Estado de São Paulo esse fenômeno pode ser identificado com muita clareza quando se olha para a memória política popular e o que é veiculado como verdadeiro pelos setores oligárquicos.
A história política oficial de São Paulo sempre foi muito vinculada aos interesses das oligarquias rurais, industriais e de serviços. O surgimento de líderes de massa era algo extemporâneo e quase anômalo. Enquanto perdurou o monopólio econômico e político da monocultura cafeeira, o eixo girava em torno daquilo que se chamava de a “política do café com leite”, que era a rotatividade do Poder Executivo entre as oligarquias de Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, mesmo depois de adotada a forma republicana. Com a transformação econômica produzida pela industrialização e a sua aliança político-financeira com as oligarquias rurais, surgem os primeiros sinais de lideranças políticas que ultrapassavam os provincianos limites de seus pagos rurais ou urbanos.
A explicação para esse paradoxo reside no fato de que o sistema político brasileiro republicano e independente tem estado sob o domínio das elites regionais oriundas de setores deprimidos da economia nacional e dependentes do Estado nacional para sobreviver. As elites políticas desses grandes Estados economicamente subdesenvolvidos – Minas Gerais, Pernambuco, Bahia, para citar só os mais evidentes – não são “representantes” dos seus Estados, mas intermediários entre o governo central e as populações de suas regiões, intermediação da qual se alimentam e da qual vivem. Num certo sentido é a macro advocacia administrativa nacional.
Assim, a existência de um setor capitalista pujante e em expansão. como o que se criou em São Paulo, termina por constituir um estilo político totalmente distinto, baseado em mecanismos muito mais claros de representação de interesses econômicos e que tende a ser repetido pela aliança dominante. Ou seja, embora em menor escala, reproduzia-se uma administração política tal qual o modelo lobista da república estadunidense – e com isso um novo apelo de poder e de execução administrativa – impunha-se como uma extrema necessidade.
Assim, operando nesse hiato de poder e na esteira dos carismáticos e populares exemplos de Jânio Quadros e Ademar de Barros, surgem os seus seguidores e imitadores. Só que, segundo estudos dos professores Adriano Duarte e Paulo Fontes (http://lanic.utexas.edu/project/etext/llilas/vrp/fontes.pdf), o quadro político dividido entre o ademarismo e o janismo não tinha a simplicidade das políticas clientelistas clássicas. Num certo sentido estava inserto no mesmo quadro que se desenvolvia no mundo e em particular na América Latina e isso significava o fortalecimento do Welfare State, algo de difícil aceitação pelo novo poder imperialista surgido como resultante da Segunda Guerra Mundial. Mesmo com a ilegalidade do PCB e a demonização da esquerda, o imperialismo se ressentia de um poder político mais forte, centralizado e de grande apelo popular. Um problema que irá ser solucionado através das experiências políticas de siglas como o PDC, PTN, PST, etc., sendo que caberá ao PDC, por sinal o primeiro partido de Jânio, a responsabilidade de preservar alguns nomes, que como “reservas” morais e políticas, irão ter importantes papéis na estruturação do que hoje é a política paulista.
Na excelente síntese feita por Antonio Roberto Fava sobre os estudos de Duarte e Fontes, em que há ênfase na influência comunista sobre esses dois fenômenos políticos, é possível se vislumbrar o cenário que seria construído após o golpe de 1964.
“Talvez uma alusão à histórica Praça Vermelha da antiga União Soviética, a capital de São Paulo também teve a sua Praça Vermelha, reduto do Partido Comunista Brasileiro, no bairro da Mooca,zona Leste da cidade. Berço do sindicalismo paulista da primeira metade do século 20, alia força política e ideológica dos moradores era tão grande que nas eleições de 1947 o partido obteve 34% dos votos válidos, elegendo três dos quinze vereadores comunistas.
No entanto, naquele mesmo ano, o partido começou a dar sinais de fragilidade e de não resistir às pressões externas e à ilegalidade,decretada em maio daquele ano.Se antes a Mooca era um dos bairros mais importantes da cidade, a partir dos anos 50 passa por um processo de “desindustrialização” com o conseqüente abandono e degradação.Antes, porém, a Mooca detinha a maior concentração industrial, principalmente indústrias têxteis e de alimentos. Era um bairro que concentrava grandes populações de imigrantes italianos (maioria), espanhóis, portugueses e “hungareses” – como são chamados, ainda hoje, os imigrantes oriundos da Europa centro-oriental, russos, lituanos, ucranianos,iugoslavos e húngaros.
“Por conta dessa variedade de origens, a Mooca foi um dos bairros mais heterogêneos da cidade de São Paulo”, diz o professor de história Adriano Luiz Duarte,da Universidade Federal de Santa Catarina. Um exemplo disso deu-se com a criação, ainda em meados de1945, dos Comitês Democráticos e Populares, sob inspiração do recém-legalizado Partido Comunista.
O pesquisador explica que inicialmente esses comitês deveriam funcionar como núcleos para agregar simpatizantes e potenciais eleitores do partido. No entanto, com o envolvimento nas questões específicas dos bairros, rapidamente esses comitês se transformaram em referência tanto para os pedidos de moradores quanto à eletricidade, pavimentação,escolas, postos de saúde, quanto de centros de atividade social, onde eram ministrados cursos de alfabetização de adultos, corte e costura e marcenaria.
Seu imenso espólio organizacional era avidamente disputado por partidos e políticos locais. A Mooca, com quase 100 mil habitantes, era o bairro mais populoso da cidade de São Paulo, além de possuir o maior colégio eleitoral, com mais de 30 mil eleitores. Os maiores beneficiados com a “extinção” do PCB eram duas figuras conhecidas no cenário político nacional: Adhemar de Barros e Jânio Quadros.
“Adhemar havia montado com o seu PSP (Partido Social Progressista) uma sofisticada máquina partidária em cada bairro da cidade São Paulo. Possuía um diretório distrital, nomeando um juiz de paz e um subdelegado de polícia. Estes nomeavam os então chamados inspetores-de-quarteirão, de modo que todo o bairro fosse esquadrinhado e conhecido em minúcias”, explica Duarte, que acaba de defender tese no IFCH sobre Cultura popular e cultura política no após-guerra: redemocratização, populismo e desenvolvimento no bairro da Mooca,1942-1973, sob orientação do professor Michael Hall.
Segundo explica, essa azeitada máquina era capaz de mobilizar todas as atividades onde pudesse manifestar a sua influência, assim como conhecer todas as demandas e todos os descontentamentos da população do bairro. Além disso, toda a máquina clientelista – dos pedidos de emprego às demandas por melhorias urbanas – devia passar pelas instâncias do partido.
“O curioso é que, ao menos no bairro da Mooca, a máquina partidária do PSP foi criada a partir de uma série de organizações locais,como clubes de futebol, associações culturais,clubes de dança, entre outras atividades sociais. Quer dizer, o PSP se aproveitou da capilaridade dessas organizações e se constituiu como partido político operando de modo semelhante ao que já fizera, no recém passado, o PCB”, observa Duarte.
Jânio Quadros, por sua vez, iniciou sua carreira política como vereador em 1947. Iniciou sua trajetória política percorrendo os bairros mais distantes da cidade, colhendo seus problemas e suas carências e depois as apresentando na tribuna da Câmara. De 1947 a 1952, Jânio foi construindo sua imagem como uma espécie de paladino da periferia e, em suas andanças, seus principais interlocutores eram as chamadas Sociedades Amigos de Bairro.
Essas organizações, surgidas em cada vila da cidade, eram herdeiras diretas dos comitês democráticos e populares de inspiração comunista.“Ou seja, tanto o adhemarismo quanto o janismo cresceram no vácuo deixado pela ilegalidade do PCB, disputando e dando continuidade ao clamor de reivindicações da população”, explica Duarte. O janismo, por exemplo, consolidou suas bases operando por dentro das mesmas organizações já existentes do bairro – clubes de futebol, associações culturais das colônias e clubes de dança. A atuação de Jânio e Adhemar na Mooca revela que as condições específicas dos bairros da cidade eram decisivas para que se pudesse compreender o que se costuma denominar populismo. “Atribuir o sucesso eleitoral desses líderes populistas unicamente ao seu carisma pessoal, é,no mínimo, um equívoco”, diz Duarte.
Ambos se sustentavam por meio de sofisticadas redes de contatos com organizações locais que mediavam o seu carisma junto aos eleitores. O contato direto, a partir dessas associações locais com moradores do bairro, segundo Duarte, foi inspirado, evidentemente,nas práticas dos comunistas, com os quais disputavam espaço.
Verifica-se ainda que Adhemar e Jânio, a União Democrática Nacional (UDN) e o PartidoTrabalhista Brasileiro (PTB) também alcançaram expressiva organização no bairro da Mooca. Mas, de acordo com o pesquisador, a UDN nunca conseguiu ser muito popular,uma vez que era identificada como o “partido do fraque e da cartola”, como a denominavam.“De fato, não parece ser a composição social que diferencia a UDN do PSP ou o janismo; a diferença talvez estivesse num difuso sentimento de superioridade expresso pelos seus integrantes e, por conseqüência, na disposição de se envolver nas árduas disputas locais”, avalia o professor.Eram freqüentes as contendas, ainda que veladas, apenas na base da provocação. Nesse contexto, os opositores da UDN a rebatizaram de “Unidos Destruiremos a Nação”,ao que respondiam acusando o PSP de “Picaretas Sempre Picaretas”.
A relação desses políticos com moradores da Mooca foi reduzida a uma relação meramente clientelista em que a moeda de troca era o voto. “Essa interpretação é equivocada por dois aspectos: primeiro porque os moradores da Mooca jogavam com políticos negociando as suas solicitações, como melhorias para o bairro. A relação era uma via de mão dupla. Parte do sucesso de políticos como Jânio e Adhemar estava na negociação direta entre os políticos e as classes populares de bairros periféricos. (Antonio Roberto Fava – fava@unicamp.br)”
Com o Golpe de 1964, que realiza uma autêntica razzia contra tudo aquilo que pudesse representar uma ligação com o que acreditavam estar superando, há um fenômeno bem singular, que é a montagem de uma estrutura política que se via por e a partir de São Paulo. De início a ditadura chega até a se sentir incomodada com esses arroubos “autonomistas”, Porém, com o passar do tempo e com o maciço envolvimento de todo o parque industrial na consolidação de um tipo específico de política, logo há a confluência de objetivos. Objetivos que, em síntese, significavam a transferência das principais bases econômicas e financeiras nacionais para o poder das empresas multinacionais.
Nesse quadro, mais do que antes, era necessária a construção de um poder político regional tão forte que até pudesse se contrapor ao poder central. Como a ditadura fez questão de bipartidarizar a vida política, não porque desejasse simplificar o direito de opção dos brasileiros, mas, por precisar de alternativas à direita e até à esquerda, alguns políticos, cuja origem remonta aos anos dourados do janismo e do ademarismo, são logo guindados à posição de protagonismo, até porque defender a democracia como um fim em si mesmo era positivo e garantia popularidade.
É, pois, nesse período que surgem os políticos que irão fazer desenho final do que hoje existe. Franco Montoro, Plínio de Arruda Sampaio, Paulo de Tarso, por exemplo, são ramos do janismo democrata cristão. Mário Covas, é uma versão reciclada do janismo com tintas sociais e um pseudo endeusamento do que seja avanço técnico e científico em termos de administração e política. Se analisarmos a essência do pensamento político de Mário Covas, em que pese a sua formidável retórica sobre democracia, veremos que foi o que o sistema queria que fosse – a supremacia de tecnologia sobre o ser humano – tanto que o seu poderoso avanço político é concomitante à expansão neoliberal e às alianças que fará com setores acadêmicos cooptados para aquelas teses do “Consenso de Washington”.
FHC, Alckmim e José Serra, por mais que se esforcem em ter algum protagonismo, foram e são meros coadjuvantes ao grande ator- Mário Covas. Como Mário Covas, unia à tintura intelectual um fantástico poder de convencimento, que era a sua oratória, mais o forte apoio que a economia neoliberal lhe fornecia, através da concentração financeira em São Paulo, foi possível garantir a lógica do “despotismo esclarecido” e da dourada redoma paulista como bases ideológicas e de ação política até hoje. Desse modo, como o neoliberalismo é quase que a segunda natureza do paulistano e paulista, qualquer luta para alterar esse quadro político, antes de mais nada, necessita ter um só lema – trazer os paulistas e paulistanos para o convívio do país.
*************************
Pedro Ayres
Jornalista

Publicado em Uncategorized | Marcado com , , | Deixe um comentário

Viagem ao passado, via Viomundo

http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/da-serie-viagem-ao-passado-no-tempo-do-recua-brasil.html

29 de julho de 2010 às 0:29

Da série Viagem ao Passado: No tempo do Recua Brasil

Edição 1534 da revista IstoÉ — 24.Fev de 1999

Recua Brasil

Cortes nos programas sociais para cumprir metas do FMI levam Fernando Henrique a enterrar promessas de investimentos feitas na campanha

GUILHERME EVELIN E RACHEL MELLO

O Brasil engatou a marcha à ré. Quatro meses depois de conquistada a reeleição, o “Avança Brasil”, programa de governo apresentado na campanha eleitoral pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, ameaça virar obra de ficção. Este ano, o País deve conhecer um recuo histórico, com queda do Produto Interno Bruto (PIB) de 3,5%, diminuição da renda per capita para os níveis de 1980 e índices de inflação e desemprego na casa dos dois dígitos, o que inviabiliza as promessas feitas pelo candidato FHC de manter a estabilidade do real e ainda tocar projetos capazes de gerar 7,8 milhões de novos postos de trabalho.

Segundo o professor Márcio Pochmann, especialista em economia do trabalho da Universidade de Campinas, a renda per capita no Brasil deve cair 4,8% em 1999, representando a volta ao mesmo patamar de 1980. Com a decisão de dobrar a aposta na política de arrocho ditada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), outro passo atrás vai ser dado nos próximos dias. Até a quarta-feira 24, o presidente deverá tomar uma decisão sobre novos cortes no Orçamento e nos investimentos das empresas estatais.

A tesourada de até R$ 4 bilhões vai atingir em cheio os programas do Brasil em Ação, um conjunto de obras consideradas prioritárias e apresentadas na campanha como o carro-chefe da retomada do desenvolvimento. Elas serão interrompidas ou adiadas. Pior: programas nas áreas sociais não serão poupados dos cortes. O candidato que pediu votos com o bordão de que o Brasil tem rumo iniciou, assim, o segundo mandato no Palácio do Planalto na trilha oposta da redução das desigualdades. “O presidente mudou de rumo. O eleitor percebeu isso e sua popularidade caiu como nunca. Junto à população, FHC ficou com a imagem potencial de mentiroso”, analisa Fátima Jordão, especialista em opinião pública.

Trabalho infantil

A primeira vítima desses descaminhos pode ser a pequena rede de proteção social no País, que funcionava de forma precária mesmo nos tempos de moeda estável. A luta pela erradicação do trabalho infantil é um bom exemplo. Segundo o IBGE, cerca de 3,8 milhões de crianças entre 5 e 14 anos trabalham hoje no Brasil. Uma das vitrines do primeiro mandato de Fernando Henrique, o programa atendeu somente 74 mil crianças trabalhadoras no ano passado. Em agosto, o governo prometeu investir R$ 60 milhões para ampliá-lo. No Orçamento, metade da verba foi cortada. Na última semana, o Planalto voltou atrás, depois de protestos de entidades nacionais e internacionais de defesa dos direitos das crianças, e se comprometeu a colocar mais R$ 52 milhões no projeto. Mas não disse de onde viria o dinheiro. “Em quatro anos, erradicaremos o trabalho infantil. Se não houver recursos, vamos recorrer ao apoio de um mutirão de voluntários “, sonha a secretária de Assistência Social, Wanda Engel. A promessa não encontra respaldo nos números. Especialistas calculam que o País teria que gastar R$ 1 bilhão por ano para erradicar o câncer da mão-de-obra infantil.

Na Educação, outros projetos que enchiam os olhos do presidente Fernando Henrique já sofreram duros golpes orçamentários no final do ano passado. O Programa de Informática, que deveria equipar com mais de 100 mil computadores escolas públicas de todo o País até o ano 2000, perdeu 90% de seus recursos. Em 1998, o Ministério da Educação investiu R$ 170 milhões no programa e comprou apenas 35 mil computadores. Neste ano, estão disponíveis somente R$ 12 milhões. “Mal dá para financiar os gastos fixos do programa”, reconhece o secretário-executivo do MEC, Luciano Patrício. As metas do projeto de Gestão Eficiente, que deveria melhorar as escolas públicas com compra de equipamentos e material, também ficam adiadas. O corte para este ano é de 67%. Na Saúde, ainda é difícil calcular as perdas porque o orçamento foi feito com a inclusão da CPMF ao longo de todo o ano. Como a contribuição só começa a ser recolhida em junho, projetos que vêm perdendo dinheiro nos últimos anos devem ser prejudicados. Entre eles, o de combate ao mosquito da dengue e o de infra-estrutura do Sistema Único de Saúde (SUS).

Antes mesmo de os novos cortes ajudarem a alimentar a fogueira social, o governo já está sob fogo cruzado. Na última quarta-feira, ao iniciar a Campanha da Fraternidade de 1999, que tem o desemprego como tema, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou uma cartilha recheada de críticas à política econômica. “Existem outras formas de fazer equilíbrio fiscal. O pagamento dos serviços da dívida priva o País dos recursos que deveriam ser destinados à educação e à saúde”, atacou o secretário-geral da CNBB, dom Raymundo Damasceno. O quadro das contas públicas dá razão à Igreja. A redução dos gastos está sendo feita para compensar a elevação de despesas com a amortização da dívida pública. Com a política de juros altos, somente entre 1994 e 1998, essa dívida cresceu 424%, passando de R$ 61,7 bilhões para R$ 323,8 bilhões.

Além da cúpula da Igreja Católica, o governo está sob pressão também do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O BID condiciona a liberação de US$ 4,5 bilhões, parte do socorro externo de US$ 41 bilhões coordenado pelo FMI, à garantia de que 21 programas sociais – seguro-desemprego, merenda escolar e agentes comunitários de saúde, entre outros – serão poupados do arrocho. “Nossa experiência em outros países da América Latina mostra que a população mais pobre é sempre a mais atingida nos choques econômicos. Por isso, queremos assegurar que esses projetos vão ser preservados”, diz Ricardo Santiago, gerente operacional do BID para os países do Cone Sul.

120 anos

Ainda que programas sociais venham a ser incluídos nesse cordão de proteção exigido pelo BID, é certo que o Brasil está perdendo, no mínimo, tempo. Estudos do próprio Banco Interamericano mostram que o País levaria 120 anos para eliminar a miséria se sua economia crescesse 2% ao ano. “O quadro social é grave. E a tendência é piorar porque não se tomam providências”, diz o sociólogo Carlos Estevam Martins, professor da Universidade de São Paulo e co-autor do livro Política e sociedade em parceira com Fernando Henrique Cardoso. “Ainda é cedo para dizer que as metas do Avança Brasil são inviáveis. Trabalhamos com um horizonte de quatro anos. A partir do ano 2000, vamos modernizar o gerenciamento dos recursos, trabalhar com mais parcerias e aprender a fazer mais com menos dinheiro”, rebate José Silveira, secretário de Planejamento e Avaliação do Ministério de Orçamento e Gestão. O problema é que o médio prazo pode ser um tempo longo demais. A história recente do Brasil mostra que vendavais econômicos geram movimentos sociais e instabilidade política.

A intenção do governo FHC era capacitar 17 milhões de trabalhadores até 2002. Em agosto anunciou para 1999 gastos de R$ 662 milhões no Plano de Qualificação Profissional (Planfor). Com a crise, o orçamento do plano foi reduzido em 50%. A meta de treinar 12 milhões de trabalhadores até o ano 2000 foi adiada por pelo menos dois anos.

“Avança Brasil”

O candidato FHC se comprometeu a aumentar o número de bolsas-escola e acabar o trabalho infantil, que hoje emprega 3,8 milhões de crianças de cinco a 14 anos. No atual ritmo, a meta é inviável.

O governo Fernando Henrique atendeu no ano passado 74 mil crianças trabalhadoras. Prometeu elevar os gastos do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) de R$ 28 milhões para R$ 60 milhões. Mas o orçamento do PETI ficou em R$ 30 milhões. O governo comprometeu-se, na semana passada, a garantir mais R$ 52 milhões, sem dizer de onde viriam os recursos. Mesmo com o suplemento, as verbas são suficientes apenas para atender 117 mil crianças.

O Programa de Garantia de Renda Mínima para crianças seria implementado este ano. A meta inicial era investir R$ 320 milhões para pagamento de bolsas-escola em cerca de 300 municípios. O corte foi de 83%. O PGRM foi transformado em programa-piloto e deve atender menos de 30 municípios.

“O Brasil tem rumo”

Menina dos olhos do candidato FHC, o programa Toda Criança na Escola pretende colocar 98% das crianças na escola até 2002. A meta ficou mais distante depois que dois projetos de apoio do programa sofreram cortes drásticos.

O projeto de transporte escolar perdeu 83% de suas verbas. Em 1998, foram gastos R$ 74 milhões para compra de ônibus para transporte de estudantes. Para este ano, apenas R$ 13 milhões estão disponíveis. Na zona rural, a falta de transporte mantém as crianças afastadas da escola.

Para manter as crianças na escola, o projeto de Assistência Integral à Criança e ao Adolescente financia atividades de esporte e reforço escolar como complemento aos estudos. Em 1998, o projeto atendeu 430 mil crianças com gastos de R$ 85 milhões. Para 1999, só estão disponíveis R$ 30 milhões.

“Marcha à ré, não”

FHC prometeu mobilizar R$ 55 bilhões em investimentos para melhorar a infra-estrutura e acabar com os gargalos que atrapalham o crescimento do País. Este ano, o PIB pode cair até 3,5%. Obras prioritárias estão sendo interrompidas e adiadas.

A duplicação da rodovia Fernão Dias, que liga São Paulo a Minas Gerais, deveria ficar pronta em 1999. Com os cortes no orçamento, a obra ficará para depois do ano 2000.

Planejado para aliviar o tráfego na região metropolitana de São Paulo, o Rodoanel teria o seu primeiro trecho de 32 quilômetros finalizado no ano 2000. Para 1999, a obra sofreu um corte de 53%. O término da obra inteira ficou para além de 2004.

A rodovia BR-230, que liga a região Norte ao Centro do País, começaria a ser pavimentada em 1999 no trecho entre as cidades de Altamira e Marabá (PA). Os R$ 40 milhões, porém, foram totalmente cortados. A obra não será sequer iniciada neste ano.

Publicado em Uncategorized | Marcado com , , , | Deixe um comentário

Emir Sader: Brasil, de Getúlio a Lula, via viomundo

Emir Sader: Brasil, de Getúlio a Lula

Data: 23/07/2010

O governo Lula representa uma nova expressão do campo popular, que teve nos governos de Getúlio e de Jango, seus antecedentes mais próximos. Governos de coalizão de classes, pluriclassistas, que assumem projetos de unidade e desenvolvimento nacional, com forte peso das políticas sociais. De Getúlio a Lula transcorreram décadas fundamentais, com elementos progressivos e regressivos, contraditórios, que chegam até o começo do século XXI vivendo uma circunstância nova, que pode se fechar, como um marcante parênteses ou como ponte para a ruptura definitiva do modelo herdado e a continuidade em um novo patamar da construção de um país justo, democrático, soberano. A análise é de Emir Sader.

por Emir Sader*, em Carta Maior

O Brasil vive um momento diferenciado da sua história política. Uma história que completará em 2010 suas oito décadas mais importantes até aqui. Desde então, há elementos de continuidade e de ruptura, pelas imensas transformações que o Brasil viveu desde então. Oito décadas em que o país mudou sua fisionomia econômica, social, política e cultural, de forma profunda e irreversível. De país rural se tornou pais urbano, de pais agrícola, país industrializado, de um Estado restrito às elites a um Estado nacional. De país voltado para fora, para um país voltado sobre si mesmo. De Getúlio a Lula transcorreram décadas fundamentais, com elementos progressivos e regressivos, contraditórios, que chegam até o começo do século XXI vivendo uma circunstância nova, que pode se fechar, como um marcante parênteses ou como ponte para a ruptura definitiva do modelo herdado e a continuidade em um novo patamar da construção de um país justo, democrático, soberano.

A ruptura mais importante, até aqui, da nossa história se deu em 1930. Até ali, grandes pactos de elite bloquearam a possibilidade de protagonismo do povo na história do país. A independência, ao contrário dos outros países do continente – com a exceção de Cuba e de Porto Rico -, não se deu pela expulsão dos colonizadores, mas pela primeira expressão do transformismo – no sentido que lhe deu Gramsci – na história brasileira. Ao invés de república, passamos da colônia à monarquia, fomos o país que mais tarde terminou com a escravidão, enquanto se consolidou o domínio do latifúndio no campo. Um pacto de elite que perpetuou os laços com a metrópole colonial, prolongou a escravidão e perpetuou a concentração da propriedade rural.

A crise de 1929 determinou o esgotamento do modelo econômico que tinha orientado toda nossa inserção – como país colonizado – no mercado internacional, como exportadores de matérias primas, quando as grandes potências que controlavam nosso comércio exterior se declararam em crise e reduziram drasticamente suas exportações e importações. Os efeitos foram tão graves que caíram praticamente todos os governos da America Latina – mesmo os progressistas, como o de Yrigoyen, na Argentina.

Desde a maior das rupturas – 1930 – algumas inflexões redirecionaram a história brasileira de maneira significativa, até o presente, dentre as quais a ditadura militar representou o marco divisório desde então. A Revolução de 30 introduziu o novo período, fazendo com que a presidência passasse das mãos de um mandatário – Washington Luis, o último presidente paulista antes de FHC, ambos nascidos no Rio, mas adotados pela elite paulista – que havia afirmado que “A questão social é uma questão de polícia”, para um – Getúlio – que fará com que o Estado assuma responsabilidades sobre os direitos sociais e passe a interpelar aos brasileiros, nos seus discursos, como “Trabalhadores do Brasil”. O fundamental foi a criação de um Estado nacional, sucedendo a um que era um consórcio das elites econômicas e políticas regionais. Essa foi a maior ruptura progressista, até aqui, da história brasileira.

O Brasil começou a ter um Estado em que passaram a se reconhecer proporções crescentes de brasileiros, mediante políticas sociais, reconhecimento da sindicalização dos trabalhadores, um projeto nacional e um discurso popular, o desenvolvimento econômico como norte fundamental do país. Iniciava-se o período mais prolongado e mais profundo de expansão da economia e de extensão dos direitos sociais que o país conheceu. As oito décadas transcorridas desde então estiveram marcadas por algumas inflexões importantes, desde a que, em 1955, redefine o desenvolvimento, que deixa de ter um caráter expressamente nacional – em que as empresas estatais tinham um papel chave – para o ingresso maciço do capital estrangeiro, com a indústria automobilística passando a ser o carro-chefe do desenvolvimento industrial, chegando a responder, de forma direta ou indireta, por um quarto do PIB brasileiro.

Uma segunda inflexão se deu com o golpe militar de 1964, esta substantiva não apenas no plano econômico, mas também social, com a abertura econômica para os capitais estrangeiros e o arrocho salarial, que são o santo do “milagre econômico”, e político, com a ruptura da continuidade democrática e a passagem a uma ditadura militar. Foi imposta pela força uma ruptura com o processo gradual de democratização social, política, econômica e cultural, passando a predominar um modelo centrado na exportação e consumo de luxo, possibilitado pela feroz repressão aos sindicatos e aos movimentos populares, com a correspondente super-exploração do trabalho.

A redemocratização representou uma ruptura político institucional sem, no entanto, romper com as bases econômicas e sociais do poder monopólico no Brasil. O poder dos bancos, da terra, da grande mídia privada, dos grandes monopólios nacionais e internacionais se fortaleceu, ao invés de serem objetos de democratização. A eleição do primeiro presidente civil depois da ditadura, ao não se dar pelo voto direto, mas pelo Colégio Eleitoral, facilitou uma nova conciliação das elites, fazendo com que o novo regime fosse um produto hibrido do velho e do novo. Passamos a ter uma democracia política sem alma social, sem alterar nosso recorde negativo de pais mais desigual do continente mais desigual do mundo. Isto é, uma democracia formal, nos moldes do liberalismo, assentada sobre a sociedade mais desigual do continente mais desigual do mundo.

Tanto assim que essa democracia foi funcional ao modelo neoliberal – hoje tão execrado nacional e internacionalmente, mas que com FHC ganhou total apoio das elites dominantes brasileiras -, que acentuou a desigualdade social, concentrou ainda mais o poder econômico e fragilizou a democracia reconquistada. FHC sentenciou a inflexão do seu governo: “Viraremos a página do getulismo.” Tinha consciência ele de que sem destruir as sobrevivências do Estado nacional, regulador, indutor do desenvolvimento, distribuidor de renda, o neoliberalismo, o reino do mercado, o Estado mínimo, não conseguiriam se impor. Foi sua obra. Fracassou e abriu caminho para o governo Lula, uma era hibrida, composta por continuidades e rupturas, possível até que existisse base material para um amplo arco de alianças que vai do capital financeiro aos pobres da cidade e o campo, que a crise atual coloca em questão.

Depois de termos participado, na década passada, do extenso e radical reino do neoliberalismo neste continente, participamos dos movimentos que, na década atual, rejeitam esse modelo e buscam formas de sua superação. Pela primeira vez, desde os governos de Getúlio, forças do campo popular dirigem, já por dois mandatos consecutivos, o país.

Como isso foi possível, depois de 21 anos de ditadura militar e de mais de uma década de governos neoliberais? Qual o fio condutor que articula o movimento popular brasileiro desde suas origens contemporâneas, na Revolução de 30, passando por estas oito décadas de acontecimentos tão significativos – progressivos e regressivos – até chegar ao complexo período que vivemos?

Da classe contra classe à questão nacional

As origens do movimento popular brasileiro precedem a Revolução de 30, nas origens da industrialização. Provêm do sindicalismo anarquista, comunista e socialista, que pela primeira vez levantaram no Brasil a necessidade de uma alternativa ao sistema de poder dominante. Suas bandeiras eram diretamente classistas, foram influenciadas pela interpretação da Revolução Russa como uma revolução “operário camponesa” e pelas lutas do movimento operário europeu. Tiveram o grande mérito de dar inicio à organização autônoma do movimento popular, centrado nos trabalhadores imigrantes, que traziam suas experiências e as doutrinas que fundaram a esquerda na Europa. Era uma esquerda urbana, sem raízes no campo, onde residia a grande maioria da população que, além disso, não chegou a elaborar estratégias específicas, assentadas na realidade brasileira. Assim, temas candentes como a da luta contra o latifúndio, contra a dominação externa, o das estratégias nacionais, não eram ainda temas centrais para a esquerda.

A crise de 1929 colocou os primeiros grandes desafios para o movimento popular brasileiro. Como reagir diante do esgotamento do modelo primário-exportador? Que estratégia nacional deveria ser elaborada para organizar as foras populares e constituir um bloco de transformação radical do país? Que posição tomar diante do nacionalismo?

Quem melhor captou a natureza da crise e as alternativas que se colocavam foi o nascente movimento nacionalista e não os partidos da esquerda – em particular o Partido Comunista, o mais importante deles. Este manteve a linha da Internacional Comunista de classe contra classe, subestimando o peso que a questão nacional passaria a ter em países como o nosso, na periferia capitalista. Enquanto que o nacionalismo soube captar o peso da identidade nacional e dos interesses nacionais no processo de industrialização que se iniciava e no marco do ressurgimento com força dos Estados nacionais no plano mundial.

A Revolução de 30 deu inicio ao que seria o movimento popular brasileiro durante as décadas seguintes. Um movimento centrado no nacionalismo como ideologia, em um bloco de forças entre o empresariado brasileiro, o movimento sindical urbano, as classes médias, comandadas pelo novo Estado brasileiro, o primeiro Estado com dimensão e ideologia nacional. Pela primeira vez o Brasil se pensava como nação e dispunha de um projeto nacional.

O modelo hegemônico introduzido pela Revolução de 1930 pode ser caracterizado como um modelo nacional-estatista, em que o impulso ao desenvolvimento se centrava fundamentalmente no Estado e na industrialização, ao mesmo tempo que a organização das classes fundamentais emergentes – empresariado nacional, classes médias e movimento sindical urbano – seria articulado pelo Estado, que incentivava a organização corporativa desses setores, mas vetava sua organização política. Esta estava dada pelo Estado e pela liderança de Getúlio em particular, que encarnavam os interesses da nação.

Essa orientação, aliada à visão classista da esquerda – em particular do Partido Comunista – implicaram num distanciamento inicial entre a esquerda partidária organizada e o movimento nacionalista. Em um segundo momento, na década seguinte, se daria a aproximação que marcou a identidade da esquerda por algumas décadas.

A postura do nacionalismo brasileiro – e latino-americano – diante do liberalismo será outro elemento essencial para definir a identidade do campo popular deste lado do Atlântico. Na Europa, o liberalismo foi a ideologia da burguesia ascendente, que lutava pela livre circulação de mercadorias, contra as travas feudais, sobretudo em relação à compra e venda livres da terra e da força de trabalho. Enquanto que o nacionalismo, numa região que não sofreu dominação externa, assumiu um caráter egoísta, chovinista, da suposta superioridade de uma nação sobre a outra – que seria profundamente explorada nas duas guerras mundiais, como expressão das contradições interimperialistas.

Já na periferia do sistema – e, em particular, na América Latina e no Brasil – o liberalismo foi a ideologia do bloco primário-exportador, cujos interesses se fundamentavam no livre comércio da exportação e da importação. Centrava-se no liberalismo econômico, que não necessariamente se casava com o liberalismo político.

Enquanto que o nacionalismo, pela dominação externa, colonial e imperialista que caracterizou nossa inserção no mercado internacional, teve um caráter de resistência nacional à exploração externa. Foi antiliberal no plano econômico, para proteger o mercado interno e fomentar a industrialização nacional. Mas foi também anti-liberal no plano político – nos casos mais conhecidos, os de Getúlio e Perón -, propondo a predominância da unidade em torno da nação e do Estado em contraposição ao sistema de partidos, que consideravam que dividiria a nação.

Essa posição do nacionalismo latinoamericano fez com que se dissociassem as questões nacional e social – fortemente reivindicadas por ele – e a questão democrática que, sob forma liberal, ficou em mão da direita. O movimento popular, especificamente no caso brasileiro, assumiu a bandeira nacionalista e social, fundada numa aliança de classes entre o grande empresariado nacional, setores das classes medias e o movimento sindical urbano. A direita buscou se opor, fundada em visões democrático-liberais.

O inicio do processo de sindicalização deu inicio ao mais importante processo de organização popular na história brasileira, mas ao restringi-lo apenas aos setores urbanos dos trabalhadores e ao não tocar na estrutura agrária, terminou se perpetuando o poder do latifúndio – mesmo que perdendo a hegemonia para a burguesia industrial ascendente -, separando o destino dos trabalhadores do campo – a imensa maioria dos trabalhadores – dos urbanos, favorecendo a continuação da emigração do campo para as cidades.

A estratégia hegemônica da esquerda se assentava na luta contra o latifúndio e o imperialismo, buscando desbloquear o desenvolvimento econômico, ao considerar que as travas externas e rurais seriam os obstáculos centrais à modernização industrial e ao desenvolvimento econômico e social do país, assim como à afirmação da sua identidade nacional. Essa estratégia considerava que haveria uma primeira etapa de luta nacional e democrática, até que se criassem as condições para uma luta anticapitalista.

Foi um período de extraordinários avanços no desenvolvimento econômico do país, na construção do Estado nacional, na conquista de direitos sociais da população e de elaboração de uma ideologia nacionalista. Coincidiu, primeiro, com a recessão internacional e o refluxo dos investimentos estrangeiros em toda a região – o que favoreceu a estratégia de industrialização pela substituição de importações – e depois com a segunda guerra e a guerra da Coréia. Coincidiu também com o maior ciclo longo expansivo do capitalismo internacional, do qual a industrialização de países da periferia como o Brasil, a Argentina e o México fizeram parte. Assim, de 1930 a 1954 abriu-se um espaço sui generis para o desenvolvimento econômico nacional, funcional ao ciclo expansivo internacional.

O fim da guerra da Coréia representou o retorno com força dos investimentos estrangeiros, particularmente os norte-americanos, estabelecendo um final do ciclo fortemente nacionalista no Brasil e na Argentina. (Não por acaso Getúlio cai em 1954, Perón em 1955). Na metade da década de 1950 chegaram os investimentos na indústria automobilística, que trariam grandes conseqüências para o caráter do desenvolvimento econômico, assim como no plano das forças sociais e do próprio Estado.

Mudou o rumo do desenvolvimento econômico, que continuou a ser o objetivo central do modelo dominante, mas a entrada do capital estrangeiro deslocou para ele – em particular para a indústria automobilística – o eixo central da economia. Com JK, o desenvolvimento passou a primar sobre o seu caráter nacional, a composição da classe operária também se viu alterada, com a imigração maciça de trabalhadores nordestinos para a indústria privada – prioritariamente paulista – em detrimento da empresas estatais e do epicentro econômico e social no Rio de Janeiro.

O movimento popular, no entanto, seguiu fortalecendo-se, tanto com a extensão da sindicalização urbana, quanto com o começo da sindicalização no campo. A polarização política continuou a se dar entre os mesmos blocos, sem refletir ainda a expansão da presença do capital estrangeiro no país.

Esta se fará sentir mais fortemente conforme as articulações para o golpe militar se intensificaram. A derrota do candidato que daria continuidade ao programa getulista – o general Lott – deslocou o bloco dominante, mas a renúncia de Jânio Quadros, ao recolocar a João Goulart na presidência, retomou-a, em uma versão mais popular, por ter a Jango como cabeça de governo. O governo Jango retomou o projeto de Getúlio – teorizado por Celso Furtado em torno das “reformas de base” -, que expressou a formulação mais articulada do projeto do movimento popular naquele período. As medidas anunciadas por Jango no seu ultimo comício – no dia 13 de março na Central do Brasil, no Rio de Janeiro – iam nessa direção: inicio do processo de reforma agrária e limitações na remessa de lucros para o exterior.

O movimento popular brasileiro tinha atingido seu auge de mobilizações, pela extensão e diversidade de suas forças e manifestações. Um governo com um projeto de reformas estruturais da economia, um movimento sindical forte, estendendo-se dos centros urbanos ao campo, passando a incorporar aos funcionários públicos e a setores das FFAA, grande capacidade de mobilização e combatividade do movimento estudantil, criatividade inédita do conjunto do mundo artístico – cinema novo, bossa nova, teatro político, entre outras expressões. O golpe viria se abater sobre todas as manifestações populares e democráticas acumuladas no país de forma brutal e direta.

O golpe revelava como a grande burguesia brasileira preferia apoiar a ruptura da democracia para consolidar sua aliança com o grande capital internacional e o latifúndio, ao invés de com o movimento popular na direção de aprofundar e estender a democracia no Brasil. Abandonou sua bandeira democrática – em nome da qual pregou e apoiou a o golpe e a ditadura – e se unificou no apoio ao novo regime e às suas políticas econômicas antinacionais.

O golpe militar foi uma das maiores rupturas vividas pela historia brasileira – esta de caráter claramente regressivo. O movimento popular brasileiro havia chegado a seu momento de maior força em toda a sua historia até aquele momento. Pela sua força de massas, pelas direções políticas de caráter nacional que havia construído, pela sua força ideológica e pelos postos ocupados nas esferas de governo, especialmente a nível nacional.

A ditadura golpeou profundamente o campo popular em todas as suas formas de existência: dos sindicatos urbanos aos rurais, das universidades às escolas básicas, dos intelectuais aos artistas, dos jornais cotidianos às revistas, dos parlamentares progressistas aos juízes, das editoras aos teatros e aos produtores de cinema, dos militantes aos simpatizantes da esquerda. Quebrou-se o eixo do campo popular, assim como suas extensas raízes de massa, instalando-se, pela primeira vez em muitas décadas, um Estado antipopular, que golpeava a democracia e o movimento popular em todas as suas dimensões.

Colocava-se um novo desafio para as lutas populares no Brasil: como enfrentar a ditadura, como reivindicar a questão democrática, ao mesmo tempo, que a o enfrentamento da dominação externa e das oligarquias internas?

Da ditadura à democracia

A ditadura militar mudou radicalmente o perfil do movimento popular brasileiro. Já não contava com as organizações de massa legais, ao contrário, tinha que computar a repressão sistemática a qualquer forma de organização – sindical, estudantil, camponesa, cultural. Tinha a questão democrática como central – a luta contra a ditadura se transformava no tema central, que poderia unificar a amplos setores afetados pela repressão. Tinha, ao mesmo tempo, o desafio de como atuar diante do fechamento de praticamente qualquer espaço de luta nos planos econômico, social, político e cultural. As formas de luta apareciam como uma interrogante a responder, da qual se deduziria uma grande quantidade de conseqüências.

A primeira reação da oposição à ditadura foi a de impulsionar a luta clandestina, propugnar por uma saída radical da ditadura e centrar suas formas de luta nas ações armadas – de forma paralela à vitória das guerrilhas em Cuba e de sua proliferação em outros países do continente, especialmente, Venezuela, Peru, Guatemala, concomitantemente com a resistência dos vietnamitas à invasão norteamericana. O movimento estudantil aparecia como o mais ativo na resistência à ditadura, enquanto se desenvolviam debates na esquerda sobre a natureza do golpe e do novo período político, assim como as formas de luta e seus objetivos, sob forte influencia da Revolução Cubana.

Na primeira etapa, sem movimento social organizado, mas contando com a brutalidade da repressão militar, a reorganização do movimento popular se centrou em torno de núcleos guerrilheiros, que conseguiram, valendo-se do fator surpresa, assestar bons golpes na ditadura – entre seqüestros e troca de prisioneiros, desvios de aviões e outras ações armadas. Passado o efeito surpresa, com o movimento de massas desorganizado, sofrendo os duros golpes da repressão e das políticas econômicas da ditadura, o movimento guerrilheiro acabou sendo cercado e derrotado, concluindo a primeira fase da luta de resistência à ditadura.

Ao mesmo tempo, apoiada na repressão política e econômica, na abertura da economia e atração de capitais estrangeiros, a ditadura lograva retomar a expansão econômica, embora agora com forte contenção do consumo popular, concentrando a realização na esfera alta do consumo e na exportação. A derrota dos grupos guerrilheiros abriu o espaço para a oposição legal. Ao mesmo tempo, o movimento de massas encontrou um novo caminho a partir da resistência do sindicalismo metalúrgico do ABC, que conseguiu quebrar a política de arrocho salarial da ditadura, vigente durante quase década e meia. Ao lado desse consistente movimento, que suscitou ampla solidariedade e projetou novas lideranças populares – a mais expressiva das quais, Lula -, se desenvolveram novos movimentos sociais – de mulheres, de negros, de indígenas, de luta contra a carestia, das comunidades eclesiásticas de base, entre outros -, projetando uma nova fisionomia ao movimento social brasileiro.

Emergiam assim duas vertentes de oposição à ditadura e de luta contra a ditadura: uma, de caráter legal, institucional, hegemonizada por uma concepção democrático-liberal, de restauração dos marcos políticos do regime democrático, com um projeto de reformas econômicas estruturais, centrado no MDB. A outra, com um projeto de construção de uma democracia com caráter social, centrado nos novos movimentos sociais, liderados pelo sindicalismo de base.

A primeira foi claramente hegemônica, durante muito tempo abrigou no seu seio quase todas as correntes opositoras. Os novos movimentos sociais foram os grandes protagonistas na luta de massas, o que deu um caráter popular à resistência à ditadura, enquanto a corrente legal parlamentar lhe impunha o caráter democrático.

A luta contra a ditadura desembocou na luta pela anistia geral e irrestrita e, depois, pela eleição direta para presidente. A hegemonia do setor democrático liberal se consolidou ao longo da década de 1970, conforme o fim da ditadura foi se configurando como um processo político institucional, de caráter eleitoral. As duas campanhas uniram as forças sociais e políticas, permitindo a constituição de uma ampla força democrática, que acabou conduzindo à transição democrática no final da ditadura. No entanto a hegemonia foi do bloco democrático-liberal, inclusive porque o bloco alternativo não propunha uma saída diferente da ditadura.

O tom diferenciado do movimento popular era a ênfase nas reivindicações sociais, além das transformações políticas, com o fim da ditadura, como seu diferencial. As duas correntes se fortaleciam, sob o influxo da luta antiditatorial – uma com ênfase na esfera política, a outra na esfera social.

Foi um período de fortalecimento do movimento social e do campo popular, com a fundação da CUT, do PT, do MST, além da mobilização popular que precedeu a Assembléia Constituinte – esta mesma uma expressão da força que o movimento democrático havia adquirido. A campanha pelas eleições diretas, as mobilizações sindicais e dos trabalhadores sem terra revelavam como a luta de resistência à ditadura mantinha a iniciativa, com grande respaldo popular.

As maiores mobilizações populares que o Brasil havia conhecido se deram em torno das eleições diretas para presidente da república. Sua derrota, porém, abriu caminho para um novo pacto de elite, quando setores da oposição e setores originários da ditadura se uniram para escolher como candidato não a Ulysses Guimarães – o líder da oposição democrática -, mas um político mais moderado, Tancredo Neves, tendo a um dirigente que até pouco antes era presidente do partido da ditadura, José Sarney, configurando como a democracia nascia como um hibrido entre o novo e o velho.

O governo Sarney foi marcado pelas condições do seu surgimento – depois da morte de Tancredo -, gerando um governo que limitou a transição à democracia como transformação apenas na esfera político-institucional, sem que a democratização tivesse também um caráter econômico, social e cultural.

O período terminou desembocando na primeira eleição direta para presidente da República, quando, porém, a polarização ditadura-democracia havia sido superada – durante o governo Sarney – permitindo que o candidato da direita – Fernando Collor – colocasse na agenda a desqualificação do Estado e da regulação econômica, apontando para a primeira versão do projeto neoliberal no Brasil. O desempenho de Lula nas eleições de 1989 fazia com que o campo popular acreditasse que suas bandeiras essenciais – ética na política e justiça social – constituiriam as propostas fundamentais da plataforma da esquerda. O tema da crise fiscal do Estado e da luta contra a inflação começava a projetar-se, pegando desprevenida a esquerda.

A campanha pelo impeachment de Collor parecia confirmar a vigência do tema da ética na política como central. A campanha eleitoral de 1994 foi protagonizada pelas Caravanas da Cidadania de Lula, centradas no tema da justiça social, enquanto a escolha do vice na chapa – José Paulo Bisol – complementava os dois eixos da plataforma opositora.

A esquerda foi pega de surpresa porque – como o entorno latinoamericano já demonstrava – a hegemonia neoliberal crescia de forma avassaladora na região. Depois de começar como favorito, Lula foi atropelado pelo Plano Real e pela candidatura de FHC, que conseguiu impor como tema central a luta contra a inflação (a inflação como imposto aos pobres e como desorganizadora da economia), retomando os temas de Collor de forma mais coerente e articulada, para triunfar e fechar o período de transição democrática, com o triunfo da hegemonia neoliberal.

Neoliberalismo: a defensiva do campo popular

A hegemonia do modelo neoliberal veio consolidar o acúmulo de uma série de fatores regressivos em escala mundial: a passagem de um mundo bipolar a um mundo unipolar sob hegemonia imperial norteamericana; a passagem de um ciclo longo expansivo em escala mundial a um ciclo longo recessivo: no Brasil e em outros países da região, regimes de ditadura militar. A hegemonia global do modelo neoliberal consolidou essa relação de forças desfavorável às forças democráticas e populares.

No Brasil o modelo tardou mais para chegar, porque o forte impulso democratizador não apenas favoreceu o fortalecimento do campo popular e de suas organizações, como desembocou na nova Constituição. A própria caracterização do seu presidente, Ulysses Guimarães, de que se tratava de uma “Constituição cidadã”, isto é, de afirmação de direitos expropriados pela ditadura e de novos direitos, a colocava na contramão do neoliberalismo, que se constituía numa brutal máquina de expropriação de direitos.

Porém, o governo Sarney limitou a redemocratização ao plano político-jurídico, sem estendê-la aos planos econômico, social, dos meios de comunicação. Seu governo esgotou o impulso democratizante, permitindo que Collor – um político vinculado originalmente à ditadura – impusesse outra polarização, que não aquela entre democracia e ditadura. Conseguiu impor a polarização entre mercado e Estado, como central e assim começou a construiu a hegemonia neoliberal no Brasil – quando ela já se impunha abertamente no México, na Argentina, no Chile, revelando como representava uma onda avassaladora.

A queda de Collor interrompeu essa primeira tentativa de imposição do modelo neoliberal, mas o novo consenso estava instalado, criminalizando o Estado e todas suas formas de regulação. A nomeação de FHC como Ministro de Economia do governo de Itamar Franco e sua posterior eleição como presidente, permitiu consolidar esse novo consenso, mediante o Plano Real, que buscava “virar a página do getulismo” – nas palavras do presidente tucano – e instaurar a era neoliberal no Brasil.

A esquerda ficou presa à sua plataforma tradicional – políticas sociais e ética na política -, sem atacar os temas da crise de um Estado historicamente esgotado e sem propostas para um novo modelo econômico.. A direita deu a sua solução à crise, colocando o Estado como alvo das transformações no Brasil, centradas na desregulamentação da economia: privatizações, abertura da economia, precarização das relações de trabalho, enfraquecimento do Estado, substituição do tema do desenvolvimento pelo da estabilidade monetária, entre outros.

Os movimentos populares passaram diretamente à defensiva. Vítimas privilegiadas das novas políticas, mediante o enfraquecimento das políticas sociais, da cassação de direitos sociais, da elevação continua do desemprego e do subemprego, do ataque aos movimentos sociais e a toda a forma de oposição, deixaram à esquerda o dilema de defender um Estado falido ou somar-se às políticas de mercado. Uma situação claramente defensiva, deslocada, com perda de iniciativa, centrada na resistência a um projeto que se apresentava como modernizador e ofensivo contra privilégios, enquanto a esquerda ficava relegada a defender um modelo esgotado, a resistir às modernizações, a resistir, sem dispor de projetos alternativos.

Foi uma virada regressiva de proporções históricas, de alguma forma tão regressiva quanto o golpe militar. Se somavam assim dois períodos regressivos quase seguidos em poucas décadas no Brasil. Ao que se devem somar as transformações, na mesma direção, no cenário internacional e continental, para terminar de configurar um quadro bastante negativo para o campo popular.

A defensiva significa, ao mesmo tempo, que uma situação de confessa inferioridade, assumir a agenda do campo inimigo, ao qual nos opomos, a perda de iniciativa e de uma agenda própria. No Brasil, a resistência popular teve um papel essencial de colocar limites à plena realização dos projetos neoliberais. Primeiro, derrubando a Collor, atrasando os programas neoliberais e, no governo FHC, colocando limites aos processos de privatização. O atraso no processo neoliberal brasileiro também contribuiu para torná-lo um neoliberalismo tardio – FHC triunfa no mesmo ano da primeira grande crise neoliberal no continente, a mexicana – e incompleto.

Depois de um amplo apoio nacional, ao caracterizar a inflação como “um imposto aos pobres” e ao Estado como problema e não como solução, o governo FHC foi perdendo apoio, até não se recuperar da crise de 1999, da qual a própria economia não se recompôs até o final do seu governo. Os dois mandatos de FHC terminavam em derrota eleitoral, mas ele havia logrado mudar a agenda nacional, conseguindo incorporar temas como a estabilidade monetária, na agenda consensual nacional, assim como contribuir para acentuar os elementos pertinentes ao novo modelo: o modo de vida norteamericano, com seu centro no consumo, o individualismo possessivo correspondente, a desqualificação da organização social e política, dos partidos, da esfera estatal. O Brasil era outro ao final da década neoliberal.

O governo Lula ou a quebra do consenso neoliberal

A eleição de Lula é produto do fracasso e da rejeição do governo FHC, da resistência dos movimentos populares e da capacidade de Lula de capitalizar esses fatores para se eleger finalmente presidente. Isso não se dá no bojo de um grande ciclo de mobilizações populares. Os movimentos populares, duramente golpeados pelas políticas neoliberais – entre elas o desemprego e a precarização laboral – pelo ataques ideológicos, políticos e repressivos contra as mobilizações de massa e as suas organizações, pelas viradas ideológicas na sociedade brasileira, haviam passado a uma situação de relativo refluxo.

Apesar de tudo isso, Lula não se havia transformado em favorito para ganhar as eleições, sendo superado, sucessivamente por Roseana Sarney e por Ciro Gomes, até que a crise da candidatura deste deixou em aberto a herança de votos, disputada entre Lula e Serra. Foi nesse momento que a Carta aos brasileiros – em que se tentava debelar o ataque especulativo contra o Brasil, feito pelos capitais especulativos – e o “Lulinha, paz e amor”, conseguiram fazer com que Lula passasse do patamar histórico de votos do PT – pouco mais de 30%,- para a cifra que lhe permitiu vencer.

Foi assim uma vitória da rejeição do governo FHC, mas que recebeu como herança não apenas a dura situação econômica, mas também consensos nacionais implantados por anos de neoliberalismo. Sua incorporação, com a Carta aos brasileiros, foi herança desse consenso.

O governo Lula manteve elementos das políticas do governo anterior e rejeitou a outras, configurando um quadro contraditório. Na sua primeira fase, primaram os elementos de continuidade, mantendo-se um duro ajuste fiscal – de que os superávits primários e a independência de fato do Banco Central são expressões. O governo assumiu formas contraditórias, com políticas sociais e política externa claramente inovadoras, mas com política econômico-financeira e política agrícola tradicional.

O campo popular elegia um governo diretamente vinculado a ele, porém refletindo as contradições desse mesmo governo e do período político em que esse governo foi eleito. Dois momentos foram traumáticos para as relações do governo com sua base popular de apoio: o primeiro, a reforma da previdência, praticamente a primeira iniciativa política do governo, que se chocava diretamente com as posições do movimento social organizado. Isso se dava no marco do ajuste fiscal que primava na primeira fase do governo, em que os contingenciamentos de recursos freavam a realização das políticas sociais em favor da estabilidade monetária, refletida nos superávits primários.

O segundo foi a crise de 2005, em que sob acusações de uso de recursos para compra do apoio de aliados, o governo chegou a ter risco de sofrer acusação de impeachment e assim terminar precocemente a primeira experiência de governo popular em mais de quatro décadas, sob acusações de corrupção, sem ter saído do modelo econômico herdado.

O governo foi resgatado pelas políticas sociais e pelo apoio popular que ela lhe propiciou. A resultante, que permitiu ao governo não apenas superar a crise, como conseguir a reeleição em 2006 e chegar ao seu sétimo ano de governo – quando FHC tinha 18% de apoio – com apoio superior a 80% e rejeição de 5%, apesar de ter praticamente toda a imprensa feroz e sistematicamente contra.

Como resultante, o governo Lula representa uma nova expressão do campo popular, que teve nos governos de Getúlio e de Jango, seus antecedentes mais próximos. Governos de coalizão de classes, pluriclassistas, que assumem projetos de unidade e desenvolvimento nacional, com forte peso das políticas sociais. Da mesma forma que os governos anteriores, cruzado por uma série de contradições, agora produto mais direto da era da globalização neoliberal.

O povo brasileiro mudou, o campo popular também, o próprio Brasil é outro. Mas há uma linha de continuidade que permite dizer que a lutar de hoje é, no essencial, a mesma de há oito décadas, quando o Brasil contemporâneo começou a ser construído.

A construção de um projeto de nação e de sociedade, é um processo em curso, entrecortado por longos períodos de desarticulação do Estado, de fortalecimento dos interesses externos na nossa economia, de predomínio dos interesses privados no seio do Estado, de importação de formas de vida alheias, de estilos e formas oligárquicas e ditatórias de forjar opinião pública.

Pode-se dizer que as forças que levaram Getúlio ao suicídio, que deram o golpe contra Jango e que se opõem ao governo Lula são as mesmas forças de direita que foram hegemonias durante a ditadura militar e que instauraram e promoveram o neoliberalismo no Brasil. E que sobrevivem no tempo, porque são os mesmos que ganham com a hegemonia do capital financeiro, com o agronegócio, com a mídia oligárquica.

O povo trabalhador é o mesmo. Foram os negros escravos a primeira geração dos trabalhadores brasileiros. A segunda foi de imigrantes europeus, pobres, lutadores sociais. A terceira geração dói a dos nordestinos que emigraram para as cidades do sul, expulsos pela violenta e cruel estrutura agrária brasileira, beneficiária da ausência de reforma agrária.

O futuro do Brasil e do povo brasileiro dependem hoje de se o governo Lula será um parêntesis na dominação das elites tradicionais – as mesmas que produziram o país como o mais injusto e desigual do mundo – ou se o governo Lula é uma ponte para abrir caminho para a saída do modelo neoliberal e o inicio da construção de um país democrático econômica, social, política e culturalmente, soberano e solidário, um país para todos – na continuidade da luta que nos conduziu de Getúlio a Lula.

O Brasil mudou e mudou para melhor, mas nem por isso o governo Lula pôde resolver os principais problemas herdados. Pelo menos o governo colocou os problemas fundamentais a resolver: a hegemonia do capital financeiro, o modelo agrícola e a ditadura da mídia privada. Nas eleições de 2010 se decide não apenas o futuro imediato do Brasil, mas a fisionomia que terá a sociedade brasileira em toda a primeira metade do século. Se há um retorno das elites tradicionais, responsáveis pelo Brasil ser o país mais desigual do continente mais desigual, ou se dará continuidade e a aprofundará as transformações que levem à construção de um Brasil para todos – democrático, diverso, solidário e soberano.

(*) Primeiro texto do livro “Brasil, entre o Passado e o Futuro”, organizado por Emir Sader e por Marco Aurélio Garcia, publicado pelas Editoras Boitempo e Perseu Abramo.

Publicado em Uncategorized | Marcado com | Deixe um comentário

Direto do Viomundo. Violencia precisa ter fim.

9 de julho de 2010 às 22:46

Em briga de marido e mulher se mete a colher, sim!

por Conceição Lemes

Janeiro. O ex-marido de Maria Islaine de Morais, 31 anos, a executa diante das câmeras de vídeo do seu salão de beleza em Belo Horizonte (MG).

Abril. Orestina Soares, 53 anos, de Duque de Caxias (RJ), é assassinada a pedradas pelo namorado. Engenho de Dentro (RJ): Dayana Alves da Silva, 24 anos, morre devido a queimaduras dois meses de o ex-marido atear-lhe fogo no corpo. Mônica Peixinho, 28 anos, é morta com um tiro na nuca em Lauro de Freitas (BA); seu companheiro é o principal suspeito é seu companheiro.

Maio. Mércia Nakashima, 28 anos, é assassinada em Nazaré Paulista (SP); seu ex-namorado está entre os suspeitos.

Junho. Eliza Samudio, 25 anos, é assassinada em Vespasiano (MG) porque tentava provar que Bruno, ex-goleiro do Flamengo, era pai do seu filho.

A imensa maioria, porém, dessas estúpidas tragédias femininas não sai nos jornais. No Brasil, agressões contra as mulheres ocorrem a cada 15 segundos. Quanto mais machista a cultura local, maior a violência contra a mulher. Os responsáveis por seus assassinatos são principalmente os atuais ou antigos maridos, namorados ou companheiros.

O Mapa da Violência no Brasil 2010, feito com base no banco de dados do Sistema Único de Saúde (DataSUS), revela: entre 1997 e 2007, 41.532 mulheres morreram vítimas de homicídio, o que significa dez mulheres assassinadas por dia no país.

“As mulheres são menos vítimas de assassinatos do que os homens”, explica Julio Jacobo Wiaselfisz, autor do estudo. “Porém, o nível de assassinato feminino no Brasil fica acima do padrão internacional. Enquanto aqui ocorrem 4,2 assassinatos femininos por 100 mil habitantes, na maioria dos países europeus, os índices não ultrapassam 0,5 caso por 100 mil.”

CRESCE PROCURA PELO DISQUE 180; MAIORIA MORA COM AGRESSORES

Essa semana a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180, da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres (SEPM), divulgou o número de atendimentos de janeiro a maio de 2010. Somaram 271.719, um aumento de 95,5% em relação aos primeiros cinco meses de 2009 (138.985).

Nesse período, a Central 180 registrou 51.354 relatos de violência. Foram 29.515 casos de violência física, 13.464 de violência psicológica, 6.438 de violência moral, 887 de violência patrimonial, 1.060 de violência sexual, 42 situações de tráfico e 207 casos de cárcere privado.

“A procura pelos serviços da Central 180 aumentou nos primeiros cinco meses de 2010 devido à campanha nacional ‘Uma vida sem violência é um direito de todas as mulheres’, realizada no final de 2009”, acredita a ministra Nilcéa, da SEPM. “Também por causa da maior divulgação da Lei Maria da Penha.”

O relatório SEPM deste ano traz informações inéditas:

* 39,8% declararam que sofrem violência desde o inicio da relação.

* 38% disseram que a relação com o agressor tem mais de 10 anos de duração.

* 71,7% residem com o agressor.

* 68,9% relataram que os filhos presenciam a violência; 15,6 dos filhos sofrem também violência.

* 58, 2% das mulheres que buscam o Disque 180 têm entre 20 e 45 anos, 68,3% estão casadas ou em união estável e 28,9% possuem nível médio de escolaridade.

E VOCÊ, JÁ FOI VÍTIMA DE VIOLÊNCIA MASCULINA?

Pense um pouco na convivência com seu marido, companheiro, noivo, namorado. Alguma vez ele:

1) Xingou-a ou fez com que você se sentisse mal a respeito de si mesma?

2) Depreciou ou humilhou você diante de outras pessoas?

3) Ameaçou machucá-la ou alguém de que você gosta, como pessoas queridas ou animais de estimação?

4) Deu-lhe um tapa ou jogou algo em você que poderia machucá-la?

5) Empurrou-a ou deu-lhe um tranco/chacoalhão?

6) Deu-lhe um chute, arrastou ou surrou você?

7) Ameaçou usar ou realmente usou arma de fogo, faca ou outro tipo de arma contra você?

8 ) Forçou-a fisicamente a manter relações sexuais quando você não queria?

9) Você teve relação sexual porque estava com medo do que ele pudesse fazer?

10) Forçou-a a uma prática sexual degradante ou humilhante?

“Se respondeu afirmativamente a pelo menos uma dessas perguntas, você já foi ou está sendo submetida à violência por parte do parceiro”, alerta a médica Lilia Blima Schraiber, professora do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, no capítulo Relacionamento do livro Saúde – A hora é agora. As questões 1, 2 e 3 indicam violência psicológica; 4, 5, 6 e 7, violência física; e 8, 9 e 10, violência sexual. Freqüentemente, os três tipos estão sobrepostos.

No livro, a professora Lilian Blima Schraiber, que pesquisa a violência contra a mulher, responde algumas dúvidas muito comuns:

– Mas essas situações não seriam apenas agressão ou abusos?

– Uma fala rude, um tapinha, um empurrão ou um beliscão não são normais entre casais?

Não. E não. Todas essas vivências são formas de violência e causam prejuízos à saúde física e mental. Só que as próprias mulheres nem sempre as percebem como violência, pois provocam uma dor sem nome. Pior. Por desinformação, desconhecimento dos seus direitos, vergonha, medo, insegurança econômica, amor pelo agressor, falta de apoio familiar e social, entre outras dificuldades, freqüentemente agüentam caladas. É como se esse fosse o único destino.

O preço do silêncio é alto: a escalada da violência doméstica e a busca tardia de saídas, quando às vezes vidas – da mulher, dos filhos ou do parceiro – estão em risco. Agudos ou crônicos, sinais e sintomas dos sofrimentos e abusos se distribuem por todo o corpo: desde diarréias, sangramentos vaginais, doenças sexualmente transmissíveis, dores de cabeça, musculares, abdominais e no peito, até depressão, ansiedade, negligência dos autocuidados, abuso de álcool e outras drogas e suicídio.

– Então, o que fazer?

Violência à mulher é problema de saúde pública. Se pintar briga, discussão, desentendimento, ciúmes, sente-se para conversar com o parceiro. O ideal é resolver tudo por meio do diálogo, inclusive a eventual separação. Agora, se for difícil lidar sozinha com a situação, busque ajuda de amigos, familiares, organizações não-governamentais, delegacias da mulher. A violência pode aumentar de intensidade e colocar em risco você e sua família. Aja enquanto ela ainda não descambou para a tragédia.

“Em briga de marido e mulher se mete a colher, sim”, avança Lilia Schraiber, pondo abaixo um velho e arraigado ditado popular. Bruno, ex-goleiro do Flamengo, usou-o em março para defender Adriano, então colega de time, que havia batido na noiva.

“Muitas vezes a própria mulher não tem consciência da ameaça”, observa Lilia Schraiber. Se é você amiga, vizinha ou parente, dê-lhe um toque. Se perceber que a situação está fora de controle, não hesite em chamar a polícia. O silêncio e o imobilismo são cúmplices da violência. Os comportamentos agressivos transgridem os direitos humanos. Questão de respeito ao direito e à dignidade da pessoa.

– Mas os homens também não são vítimas de violência doméstica, não são?

Com certeza, são. Mas as grandes vítimas da violência doméstica são as mulheres, as crianças (os meninos, mais a física; e as meninas, mais a sexual) e os idosos. Tanto que, segundo estudos feitos no Brasil e no exterior, mais de 90% das violências perpetradas contra a mulher ocorrem no ambiente familiar, e o agressor é pessoa conhecida – freqüentemente, o parceiro. Já entre os homens é o inverso. Mais de 90% dos atos de violência são cometidos por outros homens, geralmente desconhecidos, e em espaços públicos.

“Apesar dessas diferenças de taxas, toda e qualquer violência deve ser prevenida: no espaço público e privado, contra mulheres, homens, crianças e idosos”, frisa Lilia. “De novo, uma questão de respeito ao direito e à dignidade humana.”

COMO SE PROTEGER MAIS: USE ESTAS ARMAS A SEU FAVOR

 Conheça a Lei Maria da Penha na íntegra – Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Central Disque 180 – É o disque-denúncia para violência contra a mulher. Vale para todo o território nacional, e a ligação é gratuita. Atende todos os dias, inclusive finais de semana e feriados, durante as 24 horas.

A Central funciona com atendentes capacitadas em questões de gênero, nas orientações sobre o enfrentamento à violência contra a mulher e, principalmente, na forma de receber a denúncia e acolher as mulheres.

Além de encaminhar os casos para os serviços especializados, a Central fornece orientações e alternativas para que a mulher se proteja do agressor. Ela é informada sobre seus direitos legais, os tipos de estabelecimentos que pode procurar, conforme o caso, dentre eles as delegacias de atendimento especializado à mulher, defensorias públicas, postos de saúde, instituto médico legal para casos de estupro, centros de referência, casas abrigo e outros mecanismos de promoção de defesa de direitos da mulher.

 

Cfemea – Oferece informações sobre legislação e direitos da mulher.

Secretaria Especial de Políticas para Mulheres – Entre outros assuntos, contém uma relação de serviços de atendimento específicos para a mulher.

Reiteramos. Em briga de marido e mulher, namorado e namorada, companheiro e companheira, se mete a colher, sim! É por todas nós, mulheres. É também por todos vocês, homens.

Nota do Viomundo: O livro Saúde — A hora é agora, publicado pela editora Manole, tem como autores a repórter Conceição Lemes, o médico Mílton de Arruda Martins, professor titular de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da USP, e o médico Mario Ferreira Junior, responsável pelo Centro de Promoção de Saúde do Hospital das Clínicas de São Paulo.

http://www.viomundo.com.br/blog-da-saude/em-briga-de-marido-e-mulher-se-mete-a-colher-sim.html

Nota do Raposo: Eu pensava que a humanidade já tinha evoluído, mas parece que foi só nos apetrechos, pois na postura falta ainda muito ao ser humano.

Publicado em Uncategorized | Marcado com , , | Deixe um comentário

Hello world!

Welcome to WordPress.com. This is your first post. Edit or delete it and start blogging!

Publicado em Uncategorized | 1 Comentário